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PF e MPF adotam nova diretriz para investigações que citam parlamentares em casos de emendas

Para evitar anulações no STF e proteger investigadores, órgãos recomendam envio à cúpula de casos que mencionem deputados ou senadores, mesmo sem envolvimento direto

A Polícia Federal (PF) e o Ministério Público Federal (MPF) passaram a adotar um novo padrão em investigações que envolvem emendas parlamentares. A orientação interna é de que, sempre que houver menção ao nome de deputados ou senadores em apurações iniciadas na primeira instância, ainda que essas autoridades não sejam diretamente investigadas, o caso seja encaminhado à cúpula dos respectivos órgãos.

A medida tem como principal objetivo evitar anulações de processos no Supremo Tribunal Federal (STF) por desrespeito ao foro privilegiado, além de proteger os próprios investigadores de eventuais processos administrativos disciplinares. Deputados federais, senadores, ministros de Estado e de tribunais superiores, como o STJ, possuem foro especial, e qualquer citação a seus nomes pode demandar supervisão da instância superior.

Segundo integrantes da alta cúpula da PF e do MPF, essa diretriz informal já vem sendo seguida em diversas investigações abertas desde o ano passado, e deve ser consolidada em uma norma oficial. A recomendação da Polícia Federal é que suas chefias sejam consultadas sempre que as investigações envolverem repasses relacionados a parlamentares, mesmo que a suspeita não recaia sobre atos diretos desses políticos.

No MPF, apesar de não haver uma ordem expressa da Procuradoria-Geral da República (PGR), o encaminhamento de investigações à instância superior tem sido feito por precaução. O objetivo é que a própria PGR avalie se há ou não necessidade de supervisão do Supremo. Se não houver indícios de envolvimento direto da autoridade com foro, o caso retorna para ser conduzido na primeira instância.

Procurados, nem a Polícia Federal nem o Ministério Público Federal se manifestaram oficialmente sobre o assunto.

Precedentes e receios

O receio de que apurações possam ser invalidadas pelo STF aumentou nos últimos anos, especialmente após o caso do procurador que investigou suspeitas de desvios envolvendo aliados do deputado Arthur Lira (PP-AL), então presidente da Câmara dos Deputados. Mesmo sem investigar diretamente o parlamentar, o procurador acabou sendo alvo de um processo administrativo no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Em 2023, o ministro Gilmar Mendes anulou o inquérito sob o argumento de que houve violação do foro de Lira.

Desde a gestão de Augusto Aras à frente da PGR, marcada pela desarticulação de forças-tarefa e proximidade com políticos, muitos membros do MPF têm adotado uma postura mais cautelosa. A atual presidência do CNMP, comandada por Paulo Gonet, também tem mantido o controle rigoroso sobre a atuação dos procuradores, reforçando esse comportamento de autopreservação entre os investigadores.

Avanço do STF sobre investigações

Nos últimos anos, o Supremo Tribunal Federal tem retomado o protagonismo em investigações sensíveis. Uma série de inquéritos envolvendo emendas parlamentares, especialmente aquelas destinadas a prefeituras por meio de convênios federais, passaram a tramitar na Corte. Entre eles, destaca-se a Operação Overclean, que apura desvios estimados em R$ 1,4 bilhão em contratos do Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas). A operação, que investiga fraudes em licitações e repasses de emendas, tem ligações com políticos do União Brasil e é relatada pelo ministro Kassio Nunes Marques.

O julgamento do STF que ampliou recentemente o alcance do foro privilegiado — mantendo a competência da Corte mesmo após o término do mandato das autoridades envolvidas — reforçou a necessidade de cuidado por parte da PF e do MPF. Muitos processos envolvendo ex-ministros e ex-parlamentares voltaram ao STF por decisão dos próprios ministros ou a pedido da PGR.

Enquanto não há uma regulamentação clara, a diretriz de enviar à cúpula qualquer menção a parlamentares em investigações de emendas segue como uma prática preventiva. Procuradores e policiais federais avaliam que, diante do atual cenário político e institucional, é preferível pecar pelo excesso de cautela a correr o risco de ver anos de apuração desfeitos por uma falha processual.

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